16 de jan. de 2013

Simplício


Simplício era um sujeito muito sabido. Como dizia minha avó- uma pessoa muito letrada. Sabia e explicava tudo com tanta desenvoltura que deixava os mais desavisados, a sua volta, com cara de perplexidade. Gesticulava e falava muito para fazer valer, a todo custo, seu ponto de vista. Era bonachão, mas ingênuo, ao ponto de tomar como verdade, as histórias criadas por sua imaginação. 
Sua voluntariedade o tornara inconsequente. Sempre disposto a ajudar, mas na hora errada.
Certa vez quando saiamos de uma prova na Universidade, ofereceu-me carona.  Tentei evitar, mas não tive como recusar. 
No volante, ele passou o tempo todo discutindo as questões.  O pior é que as suas correções não batiam em nada com meus resultados. Eu, literalmente,  tinha me ferrado. 
Menos mal que ele teve que passar numa oficina para regular as portas do carro. Era inicio dos anos 70. O sabido tinha um DKW-Vemag- motor dois tempos. Fazia uma fumaceira danada e as portas abriam no sentido contrario as dos carros de hoje.
Ao chegar a mecânica deparou-se com um rapaz debruçado sobre o motor de um carro tentando recuperar alguma coisa que teria deixado cair.  Ele não conseguiu se segurar. Sem ser solicitado, foi logo dando palpites e oferecendo sugestões para o rapaz recuperar a porca da bateria que havia caído naquele labirinto de ferro.
Pega um arame e faz um gancho na ponta- dizia ele. Foram muitas as alternativas de recuperação, geniais, ditadas por Simplício, sem nenhum resultado. 
Encostado na mureta do galpão eu observava o espetáculo proporcionado pelo letrado. O rapaz não sabia mais o que fazer para se livrar daquele intruso.
Foi quando surgiu de dentro da oficina um senhor com cabelos, totalmente brancos, usando um guarda-pó azul. De poucas palavras e atitudes firmes tomou em suas mãos uma chave de fenda grande e encostou aos polos de uma bateria. Ouviu-se um estalo seco. E, fez-se um silencio insuportável... Enfiou, em seguida, a chave pelo bloco do motor e trouxe, na ponta da chave, a peça que estava perdida.
Desconcertado, Simplício, finalmente, calou-se.
Visivelmente nervoso, cruzava e descruzava os braços. Não se conformara com aquela cena. Encontrara alguém que sabia mais que ele.
Alguém se aproxima para lhe avisar que seu carro estava pronto.
Acertou as contas e seguimos em frente.  Simplício, ainda meio pensativo, passou a falar de futebol. Finalmente, sentiu que não era o dono da verdade.
Ainda bem que o resultado das questões da sua prova não bateram com a  minha. Ele saiu-se muito mal.