Não vou falar de tempo ruim e nem de mais uma enchente que tristemente
chega para atrasar a vida de todos, principalmente daqueles cidadãos mais
desafortunados de nosso Estado.
Vou falar, sim, de uma dessas manhãs de sol que me dispus a caminhar
pela Beira Mar, aqui em Florianópolis.
Num dia de céu limpo e temperatura agradável, caminhando no contorno da
vegetação do mangue através da avenida da saudade, resolvi, finalmente, me
aproximar e conversar com o senhor que costumeiramente, expõe e vende tarrafas
naquele local. Queria saber da maneira
como fazê-las e de onde aprendera aquele costume, tão próprio, dos habitantes
do nosso litoral. Aproximei-me e comecei
a puxar conversa. Ele apresentou-se como João e logo se dispôs a me mostrar as tarrafas que já
tinha confeccionado.
Eu comecei, então, a entrar em detalhes e perguntei-lhe se ele conhecia
uma planta chamada Tucum. O cidadão logo abriu um sorriso e me fez lembrar a
fiação do tucum, cujos fios, teciam-se as tarrafas e também as rendas de
bilros- que vi minha avó, tão magistralmente tecer, ainda quando tinha meus 8
anos de idade. João falou do seu conhecimento de todas essas tradições folclóricas que, infelizmente, está por se
perder no tempo. Contou-me que chegou a participar da Fundação Franklin Cascaes
onde tratava especificamente do resgate dessas tradições.
Eu queria saber mais da vida do cidadão e então perguntei de que região
da ilha ele fora criado. E a resposta foi uma grande surpresa. João é natural
da Laguna. Apresentei-me, como conterrâneo, e ele conhecia minha família. Sorriu
muito, ao lembrar das caronas que pegava escondido, quando moleque, na
locomotiva do porto, dirigida por meu pai.
Contou-me que era natural do Ribeirão, mas veio pequeno morar no Magalhaes.
Primeiro na região da Coréia (Agora rua da Balça) e depois foi para a Ponta das
Pedras. Veio nos anos setenta para Florianópolis. Seu pai era pescador e sempre
fora muito envolvido com a política nos tempos da UDN, na década de sessenta.
Seu nome era José. E por arrumar muita confusão durante sua aguerrida
militância politica, na Laguna, recebera o apelido de Zé Diabo.
Era um tempo em que as famílias e consequentemente os políticos,
nasciam e morriam, dentro de um partido. Os programas partidários eram bem
definidos e diferenciados. Existia fidelidade partidária e os políticos ainda
tinham vergonha na cara. Um tempo em que a instância superior do nosso Judiciário, embasava suas decisões em cima da Lei e não
do Regimento.
O homem das tarrafas, que parecia uma pessoa tão distante, mostrou-me o
quão pequeno é este mundo. E, que da época do Zé Diabo pra cá o sistema político
e o judiciário, neste país, infelizmente, mudou muito, pra pior.
Bons tempos, aquele do Zé Diabo. Bons tempos!