14 de dez. de 2010

Crônica Distante

Começo escrevendo esta crônica sem saber onde ela pode me levar. Um assunto, uma inspiração, um tema...nada me passou pela cabeça nestes últimos dias. Sozinho, numa esquina de solidão, só a nudez de idéias, me acompanha. Por que caminhos andará minhas letras? Lá fora o tempo é chuvoso, com ruas desertas e molhadas. A temperatura é agradável e o tempo náo me apressa. A vida não para e as coisas continuam a acontecer sem a minha intervenção. Ao meu redor vejo apenas alguns objetos: canetas, impressora, som, régua, grampeador, porta, cadeira, computador e os meus dedos teclando palavras soltas no meu pensamento vazio. Ausento-me para matar minha sede no copo d’àgua como toda a sede deve ser aplacada. No telefone as pessoas tratam de assuntos não muito interessantes, mas que distraem, enquanto o tempo passa. O porteiro toca! Alguém a querer entregar um sofá que não comprei. Toca novamente. A insistência desarruma minhas certezas, cutuca a impaciência e sacode a tranquilidade. Então, volto e tento alinhar meu pensamento... Que tal um café?... Ele caiu fresco e quente sem antagonismo. O pensamento foge, novamente, e vai até onde nunca pretendeu chegar. Por fim, termino essa crônica sem saber onde ela me touxe. Vou remexer o baú dos meus conflitos, desfrutar da minha inquietude. E quem sabe até a próxima crônica, meu barco não se encontre tão , á deriva. E, eu saiba onde vou estar e o que caberá.

23 de nov. de 2010

A Escolinha do Carequinha

Vez por outra o pensamento me remete a lembranças que pareciam apagadas da memória. E quando algum fato ou prova física me possibilita construir a ponte de ligação ao acontecimento passado tudo aflora facilmente na memória, como se eu estivesse folheando um antigo álbum de fotografias. Ao passar em frente aquela velha casa abandonada, no caminho da praia para o Magalhães, lembrei que ali funcionava uma das escolas primárias dos anos 60, da nossa Laguna. Era a escola estadual Major João Nunes Neto. Nessa década, de uma maneira geral, os recursos para investimentos em qualquer área eram escassos e o sistema de comunicação do país não dispunha do aparato tecnológico nem a importância e o alcance do existente nos dias atuais. E é nesse contexto que a escola com apenas duas pequenas salas, comportando cada uma, no máximo 20 alunos, funcionava. Atendia principalmente, alunos carentes das comunidades da Coréia (Rua da Balsa), Lagoa Preta e Ponta das Pedras. Na “Escolinha do Carequinha”, assim carinhosamente apelidada pela comunidade, as matriculas eram feitas de porta em porta, nas casas dos alunos, convencendo as mães da necessidade de se colocar os filhos na escola. Elas justificavam a evasão escolar por falta de condições financeiras das familias para a aquisição dos materiais escolares. Mas a Caixa Escolar, criada e mantida pelas doações das próprias professoras e de terceiros viria, em parte, amenizar o problema. Lecionar naquela escola era um verdadeiro sacerdócio. As professoras, além de se preocuparem com o ensino daquelas crianças, intelectualmente defasadas, ainda tinham de resolver os problemas familiares que afligiam os alunos. A meninada chegava para as aulas com os pés descalços e alguns deles de carinhas lambuzadas passavam por uma primeira higienização realizada pelas abnegadas mestras/mães. Além do que ainda providenciavam, às suas custas, no horário do recreio, o lanche dos seus alunos. O trabalho do magistério se constituía numa árdua batalha de resgate da cidadania daqueles alunos e de suas famílias. Eram normais aulas de reforço, depois do horário, na casa da professora. A Escolinha do Carequinha encerrou suas atividades no ano de 1974 quando se instalou na cidade, a Escola da fundação Bradesco, mas deixou sua indelével marca na comunidade do Magalhães e no coração daqueles que se tornaram os homens e as mulheres de hoje e nela tiveram seu primeiro contato com o mundo das letras. O imóvel lá permanece a merecer uma boa restauração e quiçá uma inspiradora idéia de aquisição do que restou de seu patrimônio, pelo poder municipal, para a instalação daquilo que poderia ser a biblioteca pública municipal “Escolinha do Carequinha” do Magalhães. Aqui fica o registro da historia de uma escola mantida, praticamente, pela heróica resistência de professoras, provenientes do meio de uma comunidade, com uma fervorosa vocação voltada para o magistério, que fez mudar para melhor, o destino de crianças pobres desassistidas de nosso bairro.

13 de out. de 2010

A terra comprometida

Na linha abaixo do equador nossa república desafia a inteligência do mundo com uma democracia exuberante mas um enredo de decisões dos seus poderes constituídos, capaz de deixar boquiaberto até mesmo os mais céticos dos cidadãos. O povo ordeiro e obediente assiste a tudo conformado e paciente, na esperança de uma eleição renovadora do pensamento político vigente, capaz de mudar a relação e as práticas das lides partidárias. Mas os atropelos se sobrepõem um ao outro demonstrando a falta de liderança nos poderes e uma disfarçada interferência na independência dos mesmos. As soluções simplistas encontradas, em equações de ultima hora, para a resolução dos problemas só complicam ainda mais, o processo democrático. É assim que a três dias do pleito, a justiça eleitoral decide pela não obrigatoriedade da apresentação do titulo de eleitor, durante a votação. Interessante ressaltar que tal documento, é obrigatório em quase todos os passos importantes da vida civil do cidadão. Ele só não o é, para a finalidade primeira para o qual foi criado. Do mesmo modo a instância superior de nossa justiça não teve dentes para barrar a candidatura dos eternos abutres da política, decepcionando a sociedade no empate dos votos de seus ministros no julgamento do processo de um candidato com provas incontestáveis de corrupção. Cabe aqui acrescentar que o presidente da corte negou-se a usar da prerrogativa do voto minerva. Essa indecisão da nossa justiça jogou por terra o melhor acontecimento dessa eleição: a lei da ficha limpa. Mas, por outro lado, a mesma justiça afiou sua garra para o candidato palhaço, que abocanhou a maior votação que um deputado federal já conseguiu em nossa república, tentando desqualificá-lo com o argumento de seu presumível analfabetismo. Tal comportamento revela o quão poderosa é a arma do deboche e do humor no país onde o palhaço/deputado federal, mais votado, chega a ameaçar o sistema. Com todo esse repertório hilário de acontecimentos e ações corruptas que aparecem nos noticiários políticos, quem conhece e representa melhor o Brasil profundo do que o palhaço/deputado federal, hoje na política? Chama a atenção, também, o elitismo suspeito nesse preconceito contra o suposto analfabetismo do palhaço. Quem melhor que um analfabeto ou semi-analfabeto para representar os milhões de mal educados do país? Se assim não fosse, certamente, o projeto equilibrado baseado nos valores políticos e no desenvolvimento sustentável de uma candidata ex-seringueira lá do Acre teria aval da sociedade já no primeiro turno dessas eleições presidenciais. O que restou pra nós foi uma decisão, em segundo turno, entre duas correntes de pensamentos opostos que se digladiam nas emissoras de radio e TV, com acusações pessoais e políticas, sem apresentar seus programas de governo. O que se conhece até agora é que uma dessas correntes tem caráter centralizador e prima pela presença estatal nos setores que considera de importância vital para a independência econômica do país; enquanto a outra, de tendência liberal, defende a descentralização do poder e uma maior participação do capital estrangeiro em todos os segmentos nacionais. A nossa sorte já está lançada. È só votar e esperar pra ver.

15 de set. de 2010

O Boitatá

Nas minhas recordações de infância lembro-me dos anos de Laguna de ruas muito escuras. As noites eram de uma beleza indescritível. Corria os olhos pelo céu e avistava-se com nitidez a via láctea. Parecia que, se nos esticássemos um pouco, conseguiríamos tocar nas estrelas. Era um tempo de cidades com iluminação escassa. A pequena usina instalada na área do porto para alimentar de energia dois possantes guindastes de carga, tinha também, que produzir eletricidade para parte da cidade. Isto sobrecarregava seus geradores, ocasionando seguidos blecautes e deixando a cidade, durante horas, totalmente às escuras. É nesse ambiente bucólico, propício a imaginação humana, que aconteciam os relatos de fenômenos sobrenaturais relacionados à cultura folclórica do povo. Lembro que minha mãe contava a história da aparição do Boitatá lá pelas bandas do Porto. Contava-nos que era um monstro com olhos de fogo, enormes, que corria de um lado para outro da mata perseguindo as pessoas. De dia era quase cego, à noite via tudo. O Boitatá, uma lenda do folclore açoriano, é descrito como uma espécie de cobra sobrevivente de um grande dilúvio que cobriu a terra. Para escapar ele entrou num buraco e lá ficou no escuro, assim, seus olhos cresceram. Desde então anda pelos campos em busca de restos de animais. Algumas vezes, assume a forma de uma cobra com os olhos flamejantes do tamanho de sua cabeça e persegue as pessoas nas noites sem luar. O Boitatá descrito por minha mãe era puro e singelo e sua história despertava em nós o sentimento do medo necessário para enfrentar as contingências da vida. Inconscientemente, ela acrescentava a nossa personalidade o instinto voltado para ações pensadas e contidas diante de situações adversas. A ciência, que funciona como um contraponto entre a verdade e a fé, explica o Boitatá através de um fenômeno chamado Fogo-fátuo, que são os gases inflamáveis que emanam dos pântanos, sepulturas e carcaças de grandes animais mortos, e que visto de longe parecem grandes tochas em movimento. Mas como a força da fé é, muitas vezes, infinitamente maior que a da verdade, o Boitatá continua a existir no imaginário coletivo do povo. E hoje, com o advento de todo este aparato comunicativo, ele nos aparece numa versão moderna e mais assustadora. Bem apresentado e com um falso brilho nos olhos entra, sem pedir licença, em nossos lares nos horários nobres televisivos, mentindo e pregando um tempo de maravilhas. E tudo acontece com o aval de leis criadas pelos nossos poderes constituídos, para protegê-lo. Ele não nos deixa temeroso, somente. É capaz, também, de ludibriar e acabar com o que resta da esperança de todo um povo. Tenho saudade da abençoada história do Boitatá, contada pela dona Maria. Era ingênua e despretensiosa. Só queria nos incutir a sensação do medo.

23 de ago. de 2010

Pensando sobre a cidade

Sabado, 07 de agosto-19:00 horas- chegando no monumento de tordesilhas em direção ao centro. Um deserto de frio intenso cobria a rua da praia. A solidão do mercado e das docas denunciava o silencio soturno dos casarios antigos. Logo a frente o predio do antigo cine mussi, sozinho, guardava a lembrança das memoráveis sessões de cinema de outrora. Contorno a rotatória em direção ao jardim e deparo com os casarios coloniais, desbotados pelo tempo, debruçados sobre ruas solitárias. Na igreja matriz, o relógio permanecia parado na hora de um dia passado qualquer, enquanto no jardim dos anos dourados de nossa juventude ecoava a ladaina da missa das sete, repetida como um mantra, pelos fiéis. Estacionado a beira da calçada senti um mixto de angustia e tristeza percorrer meu corpo. A cidade estava abandonada a sua própria sorte, pensei! Debruçei-me por sobre o volante do carro e meus pensamentos viajaram no tempo, no transe da reza ritmada dos fieís, por labirintos desconhecidos ao encontro de um jardim de luzes brihantes, arvores aparadas e canteiros de flores vivas e cuidadas, ornamentado por um chafariz de águas coloridas. Em seu entorno as construções coloniais com fachadas restauradas onstentavam suas cores. Um perfeito jogo de luz deixava em evidência a bonita igreja matriz e as ruas brilhavam na cidade iluminada. O Calheiro da Graça encheu-se, por fim, de casais enamorados enquanto uma procissão de pessoas circulavam, conversando animadamente, em seu redor. Tal como num dia futuro a cidade, por certo, será. Quem sabe!?

27 de jul. de 2010

A baleia franca

A noticia circulou nos jornais – Imbituba é a capital nacional da baleia franca. A indicação feita por um deputado federal da região tornou-se a lei 12282, assinada pelo presidente em 05 de julho de 2010, e confere o título àquela cidade. A baleia Franca migra para o nosso litoral, nos meses de julho a outubro a procura das águas quentes para procriar. Uma das mais impressionantes baleias do mundo e como todas as outras, sabemos muito pouco sobre a espécie. Pesquisadores acreditam que a fêmea tenha filhotes de 3 a 4 anos. Alimenta-se basicamente de krill ( é o nome colectivo dado a um conjunto de espécies de animais invertebrados semelhantes ao camarão). Vivem geralmente em grupos individuais de 3. Encontram-se distribuídas em todos os oceanos do Hemisfério Sul. No Brasil, o litoral de Santa Catarina representa uma importante área de concentração durante seu período migratório de reprodução devido as suas inúmeras baías e enseadas de águas calmas, que propiciam um habitat ideal para fêmeas acompanhadas de filhotes. As fêmeas são ligeiramente maiores que os machos. Interessante constatar que a baleia franca durante seu período de migração, circula através do oceano pelas costas das praias de nossas cidades catarinenses. Os aficcionados e observadores da espécie, geralmente se deslocam para costões e outros tipos de elevações junto às praias para terem uma visão mais acurada da espécie. No entanto, como que fazendo uma exceção a sua rotina de viagem, quando elas dobram o cabo de Santa Marta resolvem fazer uma visita a Laguna. È a única cidade que elas entram barra à dentro para banhar-se na Lagoa. Ficam a poucos metros de suas margens e dão um espetáculo a seus observadores. Não duvido, que também sejam devotas, e para seguir viagem precisam da benção de Santo Antonio. Nunca se sabe!

21 de jul. de 2010

Não sei pra que!

Era um sujeito muito inteligente. Professor conceituado com doutorado em universidade da França, mas incapaz de ouvir aquelas pessoas mais desprovidas de conhecimento. Dizia professar a fé espírita apesar de apresentar um conteúdo essencialmente materialista. Esforçava-se para conseguir ser atencioso com os mais humildes; mas mostrava pouco interesse em ouvir suas queixas. Achava que nada tinha a aprender com tais indivíduos. Arrogante, orgulhoso e firme nas suas convicções, gostava de estar sempre em evidência. O importante eram sempre seus objetivos, não importava a maneira como alcançá-los. O seu comportamento excessivamente egoísta acabou por afastar de seu convívio, sua mulher e mais tarde também seus filhos. No decorrer dos anos foi se tornando uma pessoa solitária e intolerante. É quando descobre, estar acometido de uma doença incurável. Seguiu à risca um longo tratamento que levou todas as suas economias e também o próprio apartamento onde residia. Mas, infelizmente veio a falecer. Em seu velório, a ironia da vida; uma cena que se ele pudesse teria evitado. No cemitério municipal num canto da sala do necrotério um casal pobre velava um familiar cuja urna modesta revelava toda sua humildade e no outro professores e conhecidos revezavam-se na vigília ao douto senhor. Jaz na urna mortuária o individuo perfeitamente perfilado e com fisionomia de autoridade. O sujeito parecia um rei da dinastia egípcia. Acreditem! O homem fez pose até pra morrer. Não sei, pra que!

20 de jun. de 2010

Conversa de amigo

Não gosto de me enclausurar em academia para cuidar do corpo. Sou mais adepto das caminhadas para manter o condicionamento físico. Nas minhas incursões diárias pela avenida beira mar aprecio o movimento urbano, revejo amigos e conheço outros tantos. Amigos e caminhada são ingredientes importantes para quem quer alcançar a longevidade. A ciência aprova essa combinação. Mas dia desses, um amigo que sempre passa por mim correndo, confessou-me que prefere corrida à caminhada. Afirmou com convicção que a corrida traz mais benefícios a saúde e aumenta, significativamente, nosso tempo de vida. Foi, então que lhe perguntei se ele corria daquele jeito porque pretendia viver pra sempre. Seu semblante iluminou-se, imediatamente, numa grande gargalhada. Noutra manhã encontrei um amigo psicólogo que não via há muito tempo. É uma dessas pessoas descoladas com uma maneira peculiar de olhar a vida. Quase sempre explica as coisas que vivencia de uma forma diferente. Perguntou-me se eu estava gostando da minha aposentadoria. Respondi-lhe que sim. Agora tinha tempo para me dedicar mais a família e fazer as coisas que sempre gostei. Quando indaguei sobre sua vida, contou-me que também, estava aposentado. Finalmente não tinha mais horário pra cumprir e nem um chefe a quem dar explicações. Contou-me que tem filhos maravilhosos, mas nunca pode acompanhar e curtir suas infância e adolescência como sempre desejou, porque o trabalho não lhe permitira. Não sabia como certos colegas, após trinta e cinco anos de trabalho, queriam voltar. O trabalho enobrece e dignifica o homem jovem, mas prejudica quando alcançamos uma certa idade. A essa altura da vida, disse-me ele, trabalho é pra quem não tem o que fazer. Eu tenho que viajar, conhecer lugares e cuidar de tudo aquilo que não fiz. Preciso realizar o que ficou pra trás. Agora, estou vivendo como nunca.
Eu não me contive diante dessa sua afirmação e comecei a rir da frase de duplo sentido que ele proferiu. Trabalho é pra quem não tem o que fazer.....Sei lá, eu!

3 de jun. de 2010

Quem me dera

Quem me dera ter aquela paisagem dos molhes da barra aqui na minha janela. Poderia diariamente, ver o vai e vem das ondas banhando a areia do Mar Grosso e o sol por inteiro, tingindo o céu de amarelo, quando nasce lá na linha do horizonte. Daria um tempo nesse ser recluso que o tempo me tornou e sairia caminhando descalço sobre a areia, com os braços soltos ao longo do corpo, como que desmaiados, ouvindo as musicas de amor, fé e liberdade daquelas canções dos anos 60. Esconderia do olhar dos curiosos, por alguns minutos, esse sujeito de coração quieto e contido, acostumado a ouvir muito e falar pouco. Certamente, estranharia a todos mudando o tom e o andamento de minha rotina. Não que quisesse ser outra pessoa, não! Seria só para curtir o momento e aproveitar aquele cenário de gaivotas escorregando pelo céu, fazendo lembrar de liberdade; e admirar aquela beleza estonteante grudada no infinito, lá nas lonjuras, além da ilha dos Lobos, parecendo bem perto de mim. Caminharia pelas manhãs e me entregaria ao sol e a beleza do mar daquele lugar.... e sorriria ainda com mais facilidade do que geralmente, se sorri. Penso, ás vezes, que minha visão otimista da vida me induz a ver, sentir e descrever a natureza, com um colorido nunca antes revelado. Mas é verdade, também, que o belo está no espírito das pessoas e na maneira como elas observam a paisagem. E assim, volto dessa viagem ao meu lugar comum, à minha cena real, onde tudo é palpável. Retorno à rotina sem muita pressa, com a certeza que a vida, deve sempre ser celebrada. E nas manhãs daqui da minha realidade cotidiana, observo o mesmo sol brilhando por trás de um velho flamboyant de folhas verdes e vistosas, e um Bem-te-vi, me despertando, gritando que já me viu. Quem me dera, vida!

9 de mai. de 2010

Mães

Confesso a minha dependência afetiva e emocional em relação a mulher. O tempo não conseguiu romper o cordão umbilical que sempre me uniu a ela. Considero-me uma extensão, às avessas, desse ser magistralmente preparado pela criação. Pensem, bem!? Somos gerados e montados, peça por peça, no interior de seu corpo como se fossemos um robô; alimentado em seus seios e acariciado com todos os cuidados que um ser em estado latente requer. Impossível, que essa relação intensa dos primeiros anos não fique gravado no nosso subconsciente uma vida inteira. Somos parte dela.
Contrariamente ao que, através dos séculos as religiões tem nos ensinado, elas definitivamente, não foram criadas a partir de nossa costela. Todos os fatos demonstram que nós é que fomos criados a partir delas.
A ciência afirma as diferenças na utilização do cérebro e na maneira de pensar da mulher e do homem. E conclui, que pensamos de maneira diferente. Acho que não querem dizer que pensamos erroneamente.
Basta um olhar mais observador na sua maneira de tratar o ambiente ao seu redor para notar seu toque de sutileza.
É inevitável! Sempre associamos a imagem da mulher às de nossas mães. È um sentimento intuitivo e reflexivo. Ele está arraigado dentro de nosso subconsciente. E elas já nascem mães. Mães que acariciam, alimentam e incentivam o sonho de seus filhos. Por eles, se precisar, dão a vida.
O homem poderá um dia conhecer os mistérios guardados nas fronteiras do universo, mas com certeza, jamais poderá mensurar e entender a força que move o coração de uma mãe.
Mães, mulheres, adoráveis

5 de abr. de 2010

O coelhinho da Páscoa

Quando criança eu não conseguia me livrar dessa dúvida sobre sua existência. Lembro-me que ele começou a aparecer me presenteando com cartuchos cheios de amendoins, balas, pés de moleque e muitas guloseimas próprias das crianças daquela idade.
Mas quem seria esse coelho que, entrava escondido pela madrugada da Páscoa em minha casa e, me surpreendia com tais presentes?
Minha memória não cansava de se perguntar sobre o porque dos cartuchos e das cestas, elaboradas de véspera por meus pais, para esperar por essa criatura muito especial e misteriosa, que se chamava coelhinho. Mais tarde, eu já um garotinho, descobrira que os coelhos gostavam de cenouras. E porque, então, ele vivia carregando doces?
Mas a magia da Páscoa não poderia ser contaminada por perguntas incrédulas. Afinal, chocolates, amendoins, balas e todas essas doçuras é tudo o que uma criança precisa para calar.
E assim se repetia nos anos. Na procissão do Senhor dos Passos eu não entendia o choro de todas aquelas mulheres. Alheio aquele triste cerimonial religioso da semana santa, eu não conseguia esconder a minha cara de menino feliz da vida, contando nos dedos, o dia da chegada do coelhinho da Páscoa.
Mas o tempo passou e as respostas para as minhas perguntas de criança começaram a aparecer. Entendi que a Páscoa sempre foi uma data significativa para o povo judeu. E que para nós cristãos, ela representa a Ressurreição de Cristo após sua crucificação.
Ressurgir, então se tornou a palavra chave. Surgir novamente para uma outra vida onde possamos olhar para dentro de nós mesmos e entender nossos problemas. Somente dessa maneira poderemos compreender o todo que habita, em nossa volta. Essa é a metáfora da mensagem da Ressurreição. E sob esta ótica de pensamento, o coelhinho da Páscoa, vai continuar existindo, sim! Basta, querermos acreditar.

8 de mar. de 2010

Nossas Origens

Sempre acreditei que a felicidade está dentro de cada um de nós. Não adianta procurá-la fora de nosso mundo interior. E que o lado bom da vida reside nas coisas simples que realizamos e nos gestos humildes adotados no nosso quotidiano.
É claro que um pouco de sofisticação, às vezes, não nos faz nenhum mal. Mas confesso ser um mané assumido. Pra ser mais preciso, eu sou duplamente mané. Em primeiro lugar, sou manézinho com raízes fincadas na nossa querida Laguna. E depois, mais uma vez manézinho, por ter adotado essa ilha maravilhosa de Floripa, para viver.
Geralmente, aqueles que se acham sofisticados e não me conhecem mais profundamente, torcem o nariz para a minha maneira simples de lidar com as pessoas e coisas que se encontram em minha volta.
Mas, nas minhas entranhas de mane açoriano aqui do litoral está solidificado este tipo de comportamento. Ás vezes uma ingenuidade extrema, noutras... nem tanto assim.
Valorizo enfaticamente, nossas tradições culturais e gastronômicas. Sou capaz de ir muito longe para assistir uma apresentação do Boi de Mamão, do Pau de fita, ver a Bandeira do Divino passar ou mesmo acompanhar um Terno de Reis. Quanto a gastronomia...! Abençoados sejam aqueles índios que cultivaram a mandioca e nos legaram, através dos portugueses, sua farinha para o deleite de nossas refeições. Só assim surgiu o pirão nosso de cada dia para alimentar os menos favorecidos, e tornar deliciosa as refeições festivas dos mais abastados.
Estou falando isto, porque realizei um desejo há muito tempo adiado. Fui a Festa do Pirão com Lingüiça, que se realiza de fevereiro a março de cada ano, no município de Tijucas. Nada de especial no local. Instalações modestas, como deveria ser para o que se propõe o evento. Mas o calor humano, a simplicidade e educação no atendimento me chamaram a atenção. Próprias de um ambiente onde a farinha de mandioca é prioridade na refeição. No prato o pirão pronto com feijão por cima. Lingüiça, farofa e salada completavam a dieta. Um verdadeiro retorno ás origens da nossa rica cultura. Bendita farinha!

21 de fev. de 2010

Encontro fortuito

Dias desses, num encontro fortuito em um shopping aqui na capital, revi um amigo da época de nossa adolescência. Notei que o tempo brindara seus cabelos com algumas camadas de neve e colocara no seu rosto um sorriso brilhante. Mas fiquei surpreso com a sua falta de receptividade. Como se estivesse perdido pelos labirintos da vaidade fez questão de deixar transparecer que o tempo lhe fora generoso. Minha felicidade ao vê-lo foi aos poucos se transformando em desapontamento ao notar que ele não parecia querer conversar. Mostrava-se apressado, e sua esposa, embora me conhecesse, sequer me cumprimentou, seguindo em frente com os filhos que por sinal mostraram-se mais receptivos. Na rápida conversa que forçosamente, travou comigo notei sua falta de lembrança de certos acontecimentos de juventude e uma vontade grande de me deixar seguir em frente. Mas, propositadamente, e já irritado, eu insisti e tentei lembrá-lo de amigos comuns e de algumas fotos nossa dos anos 60. Disse-me lembrar de muitas fotos daquela década, mas, nenhuma que eu estivesse junto. Senti que minha presença o estava incomodando. Parecia que eu lhe fazia lembrar de um passado, que embora bonito e sadio, ele queria esquecer. Sem precisar consultar seu coração pude notar que seu espírito tinha sido impregnado pelo sentimento da soberba. Não precisou perguntar sobre a sua vida, sobre o tempo que o escondeu dos meus olhos. Ele próprio, através de seu comportamento, revelou toda a extensão de seu orgulho fazendo questão de demonstrar que a vida lhe fora grata e justa. Mas eu não queria alimentar sua maré cheia. E tentei falar do passado, de amigos, de nossas origens, dos alicerces que formaram a base de nossas personalidades, do que hoje somos. Ele, ainda apressado, desconversou. Senti que embora bem sucedido, ele tinha perdido muito do seu conteúdo existencial e humano. E que o passado lhe parecia uma dor sem remédios. O presente reinava absoluto pelos seus dias. Então comecei a lhe falar somente daquilo que considero, os sucessos da minha vida. Revelou-se atento, naquele momento, porque pouco sabia de mim. Deu-me, verbalmente, seu email, por fim. Mas numa atitude pequena quis mostrar-se grande ao revelar, orgulhosamente, a sua ignorância em lidar com computadores, pois sua secretaria era quem lia seus email’s. Como se o sinal estivesse abrindo, partiu rapidamente. Não me deu tempo de lhe dizer mais nada.
Adeus! ex-amigo de juventude.

18 de jan. de 2010

Um novo ano

E lá vamos nós outra vez, com o norte de nossa bússola apontado para um futuro de otimismo. Sentir o Ano Novo chegar, entrar nele com novas expectativas nos envolvendo é um presente que não é para todos. Às vezes me pego pensando nas muitas pessoas que não passaram no processo seletivo da vida e não alcançaram a primeira linha de chegada do último dia do ano. Quanta desventura. Por outro lado, quanta festa para os que ficam e têm a promessa de mais um ano para viver. A vida cintila com maior intensidade no começo dos novos anos e é preciso celebrar essa glória. Os risos barulhentos, os sorrisos abertos, e as gargalhadas soltas da comemoração, me traz no pensamento o inverno de gaivotas barulhentas voando em torno dos barcos carregados de pescados quando aproximam-se da praia em direção a barra....... A mistura de sons e conversas alegres de pessoas dançando me traz a lembrança da algazarra dessas aves planando no céu e festejando a fartura. Mas, é sempre bom lembrar que para mover esta esperança de barcos carregados é necessário olhar para dentro de nossos porões, e refletir sobre nossas conquistas e por aquelas dos dias por vir; e acreditar que um ano mais de vida esta, novamente, ao nosso alcance. Muitas vezes nossos planos são como bonecos construídos com a areia fina da praia. De repente vem uma onda mais comprida e carrega tudo pra dentro do mar... transformando tudo numa massa consistente, escura e indecifrável. A areia é matéria livre e, às vezes, dissimulada e seu manuseio requer observação e cuidado. Então, notamos que é preciso recomeçar e construí-los, novamente, fora do alcance das ondas.... E assim vamos perseverando na vida e seguindo em frente porque o tempo que destrói castelos é o mesmo que constrói cidades e levanta arranha-céus. Que tenhamos todos um ano de realizações. Deus, haverá de querer.